domingo, 13 de dezembro de 2009

Episódio 5: O delicioso mundo das academias.

É chegada a hora. Sim, não da mais pra enganar. Os braços e as bochechas vão ficando mais “fortinhos” e desculpa de que as roupas estão encolhendo já não cola mais. Depois de quase 7 meses morando na Irlanda não há como negar os quilinhos a mais que saltam nítidos a frente do espelho e aos olhos alheios. Uma blusa mais larguinha aqui, uma casaco grande pra disfarçar ali, mas não adianta, não há como fugir, chegou a hora de recorrer à academia.
Tomada a iniciativa, surge primeiramente todo aquela ideia de empolgação. Calça nova de ginástica, um top apertado pra dar aquela “levantada” básica e vamos para o primeiro dia de academia. No início tudo parece legal, você começa até a se sentir mais magra depois da primeira aula, sim o que vale na primeira semana é o efeito psicológico, mulher adora essas coisas. Mas nada de dar uma de preguiçosa, começou a pagar a academia, tem que ir todos os dias (obviamente, durante semana).
Vamos lá pessoal, grita o professor, um, dois, vamos queimar calorias, não desistam! Depois do quinto dia aquilo já começa a doer no seu ouvido, é todo o santo dia de aula, vamos lá pessoal, não desistam, só mais uma vez, só mais 5 vezes, só mais 89 vezes, agora mais rápido, mais rápido, mais rápido! Ahh! fica mais estranho ainda porque tudo é em inglês e tem horas que fica bem confuso: come on! Go faster, to the left side, to the right side, squeeze, squeeze, squeeze... que porra é essa de squeeze? Tá querendo que eu esmague alguma coisa? Ou seria apertar? Ai meu Deus, até o inglês falha nessas horas.
Agora, deita no chão, 50 abdominais, mantenha um tempo lá em cima, força, força, força. Oh my God! Am I in the Army? Sim parece que estou no exército, que é isso, para de berrar no meu ouvido, caralho! Dá muita vontade de falar palavrão nessas horas, vontade mesmo da é de chorar! Ahhh, porque que eu tenho que ter a maldita tendência a ser gordinha? Talvez se eu parasse de comer chocolate, ou quem sabe eu começo a tomar Activia todos os dias... Tudo de mais idiota passa pela sua cabeça nessas horas.
Chega a hora do alongamento, que felicidade, está terminando a aula, uhul, 45 minutos de sofrimento pra queimar por volta de 200 calorias. Todo aquele chocolate do final de semana e no fim a ginástica mal queima a mera barra de cereal que você comeu antes da aula. Adoro academia!
Agora vamos ao alongamento, controlem a respiração, diz o professor, inspira quando sobe, expira quando desce. O quê? Você acha que a essas alturas eu tenho condições de controlar a minha respiração? Na verdade eu já nem sei mais como eu ainda estou respirando, Jesus! Termina logo essa aula dos infernos! Até o alongamento é complicado, não aguento mais, chegaaaaaa...ahhh que bom. Enfim, terminamos, mais um dia de muita malhação e “alegria”. Sinto dores em todas as partes do meu corpo, tudo agora é suor e cansaço, mas nada vai me tirar a felicidade de chegar em casa e comer uma enorme barra de chocolate. Afinal, pra que serve mesmo academia?

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Episódio 4: Bandeiras ao vento, a chuva esta aí!

Mais um dia de chuva em Dublin. Ah, que poético sair de casa no outono europeu com o belo guarda-chuva. Um casaco charmoso, cabelos ao vento e pessoas elegantes andando nas ruas. Outono é a estação das folhas caindo, de sentar para tomar um café na Starbucks e aproveitar os últimos dias antes do inverno... É tempo de sair de casa para caminhar nas ruas e admirar as paisagens.
Paisagem? Elegante? Poético? “Whatafuckisthisweather?” Sim, traduzindo para o português corriqueiro “que porra de tempo é essa?”
Aliás, se aprender palavrões em inglês também é melhorar o seu inglês, nenhum professor pode ser melhor que o mau tempo da Irlanda.
Ok, você deve achar que eu estou exagerando, afinal de contas, as pessoas já falam bastante palavrões por aqui. Mas agora imagine você, tentando acordar bem-humorado, colocando uma roupa que já pesa mais que o seu próprio corpo, optando hoje entre, uhmm, deixa eu ver, a capa de chuva ou o guarda-chuva? Na dúvida é melhor levar os dois.
Abro a janela e penso: “uhmm, o tempo não esta tão ruim assim, o sol está até aparecendo”. Felicidade de irlandês dura pouco. Ao sair na rua, para minha surpresa descobri que na Irlanda é possível fazer sol e chuva ao mesmo tempo. Abro meu guarda-chuva e sigo com a capa de chuva na mochila. Dali alguns passos “dou de cara” com o nosso amigo vento. Ajeitar os cabelos definitivamente é algo que não tem finalidade em Dublin, é melhor sair na rua e deixar que o próprio vento tome conta disso. Mesmo porque o guarda-chuva já não é suficiente, é preciso retirar a capa de chuva da mochila para tentar se proteger.
Cena lamentável, a pessoa andando molhada na rua, com um guarda-chuva que agora apenas segue a direção do vento, (que por sinal consegue soprar em todas as direções ao mesmo tempo) e tentando retirar a capa de chuva da mochila para colocar por cima das 259 pecas de roupas que já ocupam o seu corpo.
Ainda assim a persistência segue, continuo eu, agora também a capa de chuva, segurando o meu belo guarda-chuva. Peraí, eu disse guarda-chuva? Haha, engano meu, nesse exato momento não existem mais pessoas tentando se proteger com sombrinhas e guarda-chuvas, não, eles agora balançam bandeiras no meio da rua.
Sim, que bela celebração para um dia tão bonito e agradável, pode parecer estranho mas, bem, a Irlanda tem dessas coisas... Essas coisas de deixar você passando frio molhado no meio da rua, essas coisas de ter um vento tão horrível que pode destruir sua sombrinha, essas coisas de molhar tanto a sua cara, mexer tanto o seu cabelo que você nem mesmo consegue mais olhar para o lado ao atravessar a rua e correr o sério risco de ser atropelado. Ah... é por essas e outras que as pessoas estão agora, nesse exato momento, ontem, hoje e amanhã, nesses belos dias de outono, celebrando pelas ruas, porque de agora em diante na Irlanda, mais especificamente em Dublin, todo e qualquer objeto que se pronunciar guarda-chuva tem um encontro marcado com o vento que irá logo transformá-lo em uma mera bandeira.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Episódio 3: Vários copos de cerveja e um dedo a menos.

E como diria o velho ditado, vá para a Irlanda e perca um dedo!É claro que ninguém faria uma bobagem como essa. Mas parece que minha mente já nem tão sóbria de sábado a noite resolveu levar ao pé da letra o ditado que eu mesma acabei de inventar.
Vamos partir do início...
Apesar de estar ainda desempregada e já ter passado por algumas "desventuras" da vida na Irlanda, nada seria mais ironicamente engraçado que sair em um sábado a noite para se divertir com os amigos e acabar sentindo (literalmente) na pele, como um fim de noite pode ser muito doloroso.
Tudo corria bem enquanto eu segurava um copo de cerveja com meus adoráveis cinco dedos. Sim, eu nunca tinha dado tanto valor para os meus dedos como naquela noite, mais especificamente para o dedo indicador da mão direita que me faz tanta falta para escrever nesse momento.
Em um bar, normalmente, o processo funciona mais ou menos assim: você toma cerveja, a cerveja vai rapidamente para sua cabeça, vai mais rapidamente ainda para sua bexiga, você vai ao banheiro, usa o toalete, volta e toma mais uma cerveja. Mas se você já se encontra um pouco exaltada porque talvez dessa vez a cerveja resolveu subir mais rápido para sua cabeça do que para sua bexiga, as coisas podem não acontecer da maneira mais simples.
Em algum momento desconexo de meu pensamento, ao sair do banheiro, permito que meu dedo indicador da mão direita se posicione exatamente no local mais perigoso: o vão entre a porta e a parede. Aqueles poucos segundo que eu tinha para retirar o dedo do vão antes que a porta pudesse se fechar foram esquecidos ali; e ali também ficou o meu dedo.
Palavrões em português, lagrimas de bêbada e uma torneira com muita água correndo em cima de um dedo roxo, inchado e extremamente dolorido é tudo que me lembro daquele momento "inesquecível". A essas alturas, depois de quase uma hora no banheiro, todos os meus amigos já pensavam que eu havia resolvido fazer todas as necessidades possíveis e impossíveis ali mesmo, no banheiro do bar. Mas para sua surpresa, lá apareço eu, depois de muito tempo, com a maior cara de choro, pronta para ir embora. A noite que parecia tão divertida, acaba se tornando apenas engraçada para aqueles que não sentiram a dor de ter um dedo esmagado.
Após todas as explicações do ocorrido, termino minha noite no Mc Donald's mais próximo, fazendo o pedido mais esdrúxulo de minha vida: um copo com gelo para enfiar um dedo inchado que agora carrega o carinhoso apelido de Mc Dedo Feliz!

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Episódio 2: A maravilhosa arte de distribuir panfletos.

Recebo uma ligação inesperada no intervalo da aula: um convite para minha primeira experiência de trabalho no exterior. Que maravilha!
Aceito o convite na hora, sem hesitar. Afinal, com toda essa história da crise não dá pra ficar rejeitando trabalho por aqui.
Vou dizer que já ouvi de tudo. Pessoas formadas que trabalham de faxineira, gente que larga negócio no Brasil pra vir trabalhar de garçom e muitas outras coisas desse tipo. Mas que haviam pessoas sujeitas a entregar panfletos eu ainda não tinha ouvido. A questão agora é saber, o que seria exatamente o ato de entregar panfletos? Quando me convidaram, a primeira coisa que pensei foi que eu iria ficar no meio da rua entregando aqueles folhetos que as pessoas jogam fora no próximo lixeiro. Opção errada! Entrei de gaiato na história e quando vi lá estava eu em outra cidade, próxima à Dublin, distribuindo folhetos nas caixinhas de correio de várias casas. Mas essa não é a melhor parte. Mesmo com toda a empolgação de um primeiro dia de trabalho, nada poderia desanimar mais que a bela chuva que caia. Que delícia!
Equipamentos necessários: capa de chuva, mochila com água, um sanduba para o almoço e, obviamente, espaço para carregar 500 folhetos que além de pesados, aumentavam minha fome a cada vez que eu tinha que olhar para as pizzas que estavam neles.
Exercitar o inglês nesse momento não é prioridade porque ali você só encontra brasileiros. Aliás, como disse um dos colegas do grupo, a ordem de prioridade funciona mais o menos assim: banheiro, pizza e só depois o pagamento. Sim, a pizza faz parte do "salário", e podem ter certeza que depois de um longo dia de trabalho, ela virou a melhor pizza que já comi na vida.
Como vocês podem imaginar, o salário não é dos melhores. Dizem até que já pagaram mais para fazer esse tipo de serviço, mas alguém teve a brilhante ideia de diminuir o valor porque existe, a cada dia, mais brasileiros para fazer esse tipo de trabalho. Lei da oferta e da procura colocada em prática. Uhul!
Mas não pensem que estou reclamando não. Afinal de contas tudo tem um lado bom na vida. Além de eu estar ali por vontade própria, conheci pessoas interessantes e no final ainda ganhei uma pizza (acho que já mencionei isso). É que o engraçado de toda a situação é você perceber que está aqui, longe de tudo, sujeito a um tipo de trabalho que jamais faria no seu próprio país e ainda se sentindo feliz por isso!
Experiência de vida? Constrangimento? História para contar para os netos? Eu ficaria com a terceira opção. Não que eu ache que a gente precise passar por perrengues toda hora só pra ter história pra contar. Mas tem coisas na vida que somente vivendo a situação é possível compreender como funciona. Você acha que agora eu vou conseguir tratar mal alguém que vier colocar folhetos na minha caixinha de correio? Muito pelo contrário, agora eu vou até lembrar de prender o cachorro se alguém vier entregar jornal na minha casa.
Divagações à parte, o que importa é que volto para casa feliz com meus 30 euros (que já vão sumir na primeira ida ao mercado), mas que com certeza significaram muito mais que um mero salário mal pago. Afinal, essa foi a primeira vez que fiquei feliz em saber que tudo acaba em pizza!

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Episódio 1: Doce tragédias de um início de viagem.

Olho para o microondas. 8:50 da noite. No Brasil, de acordo com o fuso-horário, devem ser 4:50 da tarde, penso eu. Penso porque é a única coisa que me resta fazer nesse apartamento gigantesco onde (por enquanto) resido sozinha. A TV não funciona, não há rádio, nem computador e as pessoas que moram no prédio ainda não conheço bem. A ideia de morar na Irlanda que parecia ser tão divertida começa com pequenas "tragi-comédias" da vida que não seriam tão interessantes se não fossem escritas.
A primeira delas, como já citado, foi a televisão. Sim, exatamente, aquela que desprezamos tanto, é a que mais me faz falta nesse momento tão peculiar da vida.
Aperto todos os botões, verifico a tomada, tento o controle remoto e nada! Ela simplesmente não funciona.
Lamento informar (a mim mesma) que a TV virou um mero detalhe quando tive a brilhante ideia de esquentar água para fazer um "coffee". Afinal de contas, estou sozinha no apartamento, não tenho televisão e (ainda) não tenho vontade de me embebedar.
Tomada a decisão de fazer o café, assim como de costume, coloco água na chaleira e ponho no fogão para esquentar. Começo já a imaginar o gosto do café quentinho na boca. Gostaria mesmo é de sentir o cheiro do café fresquinho saindo do coador, porém, minha imaginação não é forte o suficiente para disfarçar o cheiro de queimado que adentra minhas narinas. Puta que pariu! A chaleira era elétrica. Desligo o fogão correndo, mas o plástico já está todo derretido em cima da chapa. Ora essa, nunca tinha visto na minha vida uma chaleira elétrica. Mas a melhor parte ainda está por vir, olho atrás da porta de entrada do apartamento e logo um simpático bilhetinho que diz o seguinte: "qualquer dano causado nesse apartamento deverá ser cobrado do morador". Não vamos entrar em detalhes quanto ao custo porque preferi esquecer essa parte por alguns instantes.
Isso tudo porque estou contando apenas uma parte do que já me aconteceu. Ainda deixei de lado uma tomada estragada, dois dedos queimados e uma calcinha que serviu de elástico para segurar a pequena alavanca que faz a água do banho sair pelo chuveiro e não pela banheira.
Mas, por outro lado, o que seria desse texto sem todos esses acontecimentos? O que seria de mim sem um papel e uma caneta nesse momento em que não tenho televisão, não tenho computador e para completar, estou longe da família e dos amigos? Não resta mais nada além de pensar e escrever.
Ao final do texto olho novamente para o microondas. Ele continua marcando 8:50 da noite. Que ótima notícia: o relógio do microondas também está estragado.